sábado, 9 de junho de 2012

Capitulo 4. R.D.



Capítulo quatro - Ultrapassar o ultrapassado.


A porta envidraçada abriu-se em suspense.
De lá saiu Jason, de cabeça baixa, se calhar desconfortável por ser a primeira vez num longo período de tempo, em que se designar a tomar a refeição em família.
A luminosidade baixa do compartimento, à qual a mesa rectangular ocupava o espaço de extremo a extremo, assentou nos cabelos-trigo de Jason servido por vestes negras, a não variar, mas casuais: Camisola de malha cinzenta, manga comprida a combinar com o gorro; calças pretas como usual e Vans fundidos na bainha das calças.
Lissa sentiu uma guinada no estômago, que a fez acanhar-se e afundar-se na cadeira. E no silêncio constrangedor, a voz de Jason prevaleceu:


- Estás cá? - Olhou para o pai - É para admirar.


Pai e filho sorriram mutuamente. Fora esse um sorriso falso? Manhoso? Sarcástico?
Jason estava senão surpreendido, por ver Carl desfrutando do lar. Que cometa estaria para cair, afinal de contas? Ao que parecia, Carl decidira deixar os criminosos e delinquentes à conta de outros, pensava Jason, irónico até em pensamento.
O rapaz sentou-se ao lado de Glory, por oposição a Lissa. Ficaram frente a frente, e nãos despregavam olhos um do outro. O fervor culminante ganhou força no peito dela, estava claramente intimidada por aquele olhar gélido, contudo, ainda furiosa. 


- Fico feliz pela tua iniciativa - Falou Carl.


- É - Jason continuava vidrado em Lissa - Digamos que às vezes até me chego a surpreender a mim mesmo. Tenho de...ultrapassar, não é verdade mãe?


Glory ficou tensa. Carl endureceu o olhar ao filho. Lissa ficou alheia ao momento...
A verdade, crua e muda, é que Lissa não fazia a mínima ideia da existência de qualquer filha/irmã falecida na família. Tal informação fora-lhe omissa a pedido de Carl, e como tal, Jason tivera o direito de não querer confianças com a mesma em troca do seu silêncio. Simples.
Apareceu um individuo magro, muito alto, barba negra e todo abotoado numa sobre-casaca preta. Tratava-se de Phill, ou como Jason gostava de troçar: Phill, o nariz de tucano, isto devido às dimensões exageradas a nível nasal, que o pobre coitado possuía. 
Jason designava Phill, sendo uma pessoa fria, inexpressiva, semelhante a uma figura de cera. E para além do mais, nunca se zangava com ele dissesse ou fizesse o que quer que fosse. Jason, por vezes, gostaria de ver o mordomo reagir, que lhe gritasse ou se enfurecesse, tal como acontecera com Charllotte quando o rapaz lhe trocou o açúcar por sal e esta servira, num jantar de alto calibre, brigadeiro salgadíssimo. Bem, não estava assim tão mau. Pelo menos Mars gostou tanto que o lambeu até à ultima migalha.
Retomando Phill, como assunto, Jason iria adorar ver o homem explodir. Contudo, não contava com isso. O homem era o tipo de pessoa que mesmo que o mundo estivesse a cair, nem sequer se mexeria.


- O Pato está pronto a ser servido. Dão-me licença honrados?


- Aw, era seu primo afastado? - Troçou Jason, de Phill - Lamento muito.


- Olha a insolência Jason - Repreendeu-o Glory, tentando não achar graça ao filho. 


- O seu humor comove-me menino - Para variar, Phill permaneceu inexpressivo. Bestial, não haja dúvidas.


Entrou Dora, carregada entre mãos. Viu-se-lhe o ar de espanto, assim que cruzou o olhar com o de Jason. Este por sua vez esboçou um sorriso discreto e excitado. Lissa captou essa atracção, e sem querer engasgou-se com o pão que mordiscava enquanto o comer vinha e não vinha.
Olhando-a em disparo, Jason arqueou a sobrancelha... «Selvagem».
Dora, de propósito ou não, colocou-se entre as cadeiras de Jason e Glory, servindo os presentes. Jason aproveitou para colocar a mão onde não devia. A jovem empregada sobressaltou-se, e envergonhada, saiu dali entre calores.
Lissa sentia-se tão encavacada, que precisava...de...água... urgentemente!!


- Podes passar-ma? - Pediu ela, ao irmão.


Jason olhou para o frasco com o líquido incolor. Encolheu os ombros, dizendo:


- Tens mãos e bom corpo, Levanta-te e vem tu buscar.


Glory deu um biscoito na nuca, fazendo-o arrepender-se dos maus modos. Jason, resignado, pegou o frasco e esticou-se até a mão de Lissa receber a água. Tocaram-se ao de leve, momento fugidio mas que por momentos, os fez parar no tempo.


- Mãe - Disfarçou Jason -, tenho de te falar.


- Diz-me então - Incentivou-o Glory.


- Sabes o Deuce? - Os olhos de Lissa dilataram, prevendo a maldade na expressão de Jason - Não ando a gostar muito do trabalho dele.


Enfim, a razão que levara Jason a dar-se ao trabalho de jantar com a família. Fazer queixinhas e persuadir a mãe a fazer-lhe mais uma vontade. Abismada, Lissa tinha de reagir! 


- Eu gosto muito - Meteu-se, sendo assassinada pelo olhar dele, mas ainda assim, acrescentou: Acho-o bastante simpático, e hoje até me salvou.


- Salvou-te? - A preocupação de Carl veio ao de cima - Salvou-te de quê?!


- Eu ia caindo, ali na zona pantanosa ou lá o que é - Revelou Lissa, captando o interesse dos pais.


Jason ergueu-se arrebatadoramente da mesa, raspou o braço na mesma e derrubou parte da loiça de valor incalculável.
Carl, Glory e Lissa ficaram a olhá-lo, perplexos pela a atitude do jovem revolto.


- Filho - Arquejou a mãe, de mãos ao peito.


- Já te lembraste de mim? - Furioso, Jason deixou a pergunta pender no ar, e saiu de jantar tomado.





Jason estava na biblioteca ou escritório, numa perspectiva mais abrangente, lendo na pesada noite de Dezembro, procurando consolo nos livros. Sinceramente, o próprio estava à espera que o Jantar tivesse tido outro fim que não aquele desastre natural, originado por Lissa. Aquele impertinentesinha.
A porta abriu-se violentamente, e saída sem consentimento, a mesma a quem rogava pragas, entrou. Vinha toda determinada e luzia nela um olhar de puro ódio.
Jason, sem mexer a face, olhou para os lados. Sentado no sofá,e de perna cruzada, Jason ergueu o livro ao alto, a fim de se esconder. Em menos de nada viu-o rolar até ao outro lado do espaço.


- Faltam-te modos - Comentou Jason, irónico, sarcástico e arrogante, tudo em simultâneo numa só pessoa desprezível. 


- E a ti falta-te o quê? Seu sem sentimentos...


- Insensível, não quererás tu dizer? - Corrigiu-a.


Aquele olhar já não a intimidava.
Aquele modo arrogante, muito menos. Estava diante dele, obrigando-o a manter-se sentado de modo a ouvi-la até ao fim.


- Querias que a mãe despedisse o Deuce? 


- Não é da tua conta!


- Ele é meu amigo, claro que é da minha conta - Asseverou-se Lissa.


- Teu amigo? Pffff, qualquer escumalha te serve não é verdade? - Levantou-se, obrigando-a a afastar-se um pouco.


Ficaram frente a frente, e preparados. Preparados para arcar com próximas palavras, acusações e insultos.


- Vês como não tens calibre para esta família? Falta-te classe, sua selvagem...sinha!!!!


- Ahh - Atiçou-se Lissa - Claro! Eu é que sou a selvagem, no entanto, não ando por aí a mandar loiça para a merda! Nem a querer despedir pessoas inocentes. Muito bem Jason, foi muito très chic da tua parte.


Ele ficou boquiaberto. Que astucia a dela... e má educação!


- Tic Tac Tic Tac, o teu tempo acabou, põe-te a andar! - Despachou-a, em vão. 


- Porquê? Porque é que és assim? - Aproximou-se ainda mais dele, semicerrando-lhe os olhos.


- Porque - Aproximou-se também -, não te suporto.


- Ciumes? Queres exclusividade total da mãe e do pai?


- Claro que quero. Sou-lhes o único filho, tu não passas da mancha negra...adoptada!


Nisto, e impelida pelos nervos, Lissa deu-lhe um estalo de toda a amplitude. 
Jason, como resposta, agarrou nela a sentou-a por obrigação no sofá. Prendeu-lhe os pulsos aos apoios, e ficou a olhá-la furtivamente.


- Eu...odeio-te - Proferiu Jason, sem o mínimo esforço.


- O sentimento... é mutuo - Retorquiu Lissa, declarando guerra.